Pernambuco

Grupo João Santos: de potência da América Latina com o Cimento Nassau à suspeita de desvios de 8 bilhões

Quem não lembra do Cimento Nassau do poderoso Grupo João Santos, que já chegou a ser um dos maiores da América Latina? O grupo já chegou a ter um faturamento de R$ 3 bilhões em 2010 e cresceu na esteira do aumento do consumo do cimento que ocorreu no Brasil até a crise de 2014/2015. A crise na construção civil provocada pelos anos de pouco crescimento econômico, a morte de um dos seus fundadores, o empresário João Santos, e uma acirrada disputa dos herdeiros pelo controle da empresa levou o grupo a um impasse que começou atrasando o pagamento dos salários e foi parar em processos na Justiça do Trabalho e na operação realizada nesta quarta (5) pela Polícia Federal.

Do Amazonas ao Espírito Santo, são 11 fábricas de cimento, incluindo uma localizada em Itapessoca, em Goiana. Desse total, nove já estavam paralisadas desde 2018. Quando elas estavam em pleno vapor, o grupo chegou a ter 13% de marketing share de todo o cimento produzido no Brasil. Do faturamento de R$ 3 bilhões em 2010, o cimento respondia por 60% desse total. Em 2018, o faturamento do grupo não chegava a R$ 1 bilhão.

As atividades do grupo também incluíam comunicação, coma TV Tribuna em Pernambuco e no Espírito Santo, papel e celulose, açúcar, transporte e mineração. Nos anos 90, foram publicadas várias matérias sobre inovações que estavam sendo implantadas na Usina Santa Teresa, em Goiana, e também na Celulose e Papel de Pernambuco (Cepasa) instalada em Jaboatão dos Guararapes. Inteiro, o grupo tem 47 empresas. O conglomerado chegou a ter cerca de 14 mil funcionários por volta de 2010. Em 2013, este número já tinha sido reduzido à metade.

O fundador do grupo, o empresário João Santos faleceu em 2009, aos 101 anos. Dos seis filhos do empresário, quatro estão vivos. Depois disso, a briga sucessória pelo comando do conglomerado ocorreu entre dois grupos, dividindo os irmãos. Um grupo é formado por José e Fernando Santos, que sucedeu o fundador na presidência do grupo. Os dois juntos detém 32% de todo o patrimônio, segundo uma matéria publicada pelo Valor Econômico em 2018.

O outro grupo que disputa o comando do conglomerado tem à frente as irmãs Ana Maria e Maria Clara e uma parte dos 15 netos, chegando a ter 68% do controle das ações. Foi este último grupo que denunciou as autoridades acusações como delapidação do patrimônio e sonegação fiscal – que provocaram a investigação da Polícia Federal. Mesmo esse grupo tendo um controle acionário maior, um pouco antes de João Santos morrer foi feito um acordo que prevê que a destituição dos dois irmãos só poderia ocorrer com a aprovação dos sócios que somassem 75% do controle acionário. Por isso, o segundo grupo, mesmo sendo majoritário não conseguiu alterar o comando.

Com os salários em atraso pelo menos desde 2016, também começaram a ocorrer protestos de ex-funcionários que acionaram a Justiça do Trabalho para receberem os valores atrasados. A Polícia Federal informou uma estimativa é de R$ 8,6 bilhões entre o que pode ter sido sonegado e o que deixou de ser pago aos trabalhadores, baseada em informações apuradas pelo Ministério Público Federal e a Justiça Federal. A Justiça do Trabalho chegou a anunciar leilões de algumas unidades industriais com a intenção de pagar aos trabalhadores com a venda dos empreendimentos.

Além da disputa pelo controle acionário, a produção de cimento passou por reduções drásticas com a estagnação que ocorreu na construção civil com a recessão que começou no último trimestre de 2014 e se estendeu até praticamente 2017. Mesmo quando a economia voltou a crescer, o consumo de cimento não voltou ao mesmo patamar dos anos de crescimento, como ocorreu, em vários anos, até 2013. Também ocorreram fusões de empresas estrangeiras, que passaram a disputar o mercado da fabricação de cimentos no Brasil.

Na manhã desta quarta-feira, a reportagem do JC entrou em contato e mandou e-mail para diretores e pessoas da família, mas ninguém atendeu o telefone. No escritório da empresa no Recife, uma pessoa atendeu o telefone convencional, mas informou que ninguém da diretoria iria falar nesta quarta-feira (05).

JOÃO SANTOS

Além de grande visionário, o empresário João Santos sempre deu muito importância a educação. Nas unidades das suas fábricas, muitas instaladas no meio do mato em cidades do interior, sempre havia uma escola para os filhos dos funcionários e, na época, os professores recebiam treinamentos com professores contratados de outros Estados, como acontecia nas fábricas do Piauí ao Amazonas.

Nascido em Serra Talhada, ele começou a trabalhar aos oito anos de idade na seção de etiquetas da Fábrica de Linhas de Pedra, que pertenceu a outro grande empreendedor, Delmiro Gouveia, em Paulo Afonso. Aos 22 anos, se formou em Economia pela então Faculdade de Comércio de Pernambuco. Depois disso, começou a atuar na empresa Adriano Ferreira & Cia como chefe de escritório, tornou-se diretor de vendas e posteriormente sócio minoritário da empresa.

Em 1934, em parceria com o seu sócio português Adriano Ferreira, deu o primeiro grande passo como empresário: a compra da Usina Sant’Anna d’Aguiar, em Goiana, de cujas ações detinha 35%. Um ano depois eles venderam a usina, mas em 1937 resolveram comprar outra, a Santa Teresa, que pertence ao grupo até hoje e passou a ser somente da família João Santos a partir de 1939. A última vez que a usina moeu foi na safra 2016/2017.

A Fábrica de Cimento Nassau, até então o maior empreendimento do grupo, foi implantada em 1951 e o nome era uma homenagem ao conde Maurício de Nassau. Na época, foi a maior unidade do ramo instalada no Nordeste e grande parte da produção era destinada ao mercado do Sudeste que tinha maior potencial consumidor. Ele construiu um grande império a partir das fábricas de cimento e, aos poucos, foram sendo implantadas mais unidades industriais. Do Ne10.

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