Pernambuco

Óleo nas praias do Nordeste não vem de novo vazamento e se assemelha ao de 2019

O óleo encontrado em dezenas de praias do Nordeste nos últimos dias não tem características de um vazamento recente, explicam pesquisadores. Os fragmentos recolhidos ainda estão passando por análise química, mas principal hipótese é que o material seja resquícios das grandes manchas que poluíram o mesmo litoral há dois anos.

Mesmo com volume menor de poluição, pelo o que foi registrado até esta terça-feira (30), especialistas alertam para o risco de contaminação dos pescados, principalmente pela recorrência desse tipo de evento.

Depois do trauma provocado em 2019, quando centenas de praias ficaram poluídas, a reaparição de óleo no litoral da Bahia, Alagoas, Pernambuco e Paraíba desde o final da semana passada, reacendeu a preocupação com a possibilidade de uma nova tragédia ambiental. Nos últimos dias, secretarias estaduais, a Marinha e o Ibama fizeram monitoramentos e recolheram fragmentos para análises laboratoriais, cujos resultados devem ficar disponíveis em cerca de três dias.

Professor de Engenharia Ambiental da Escola Politécnica da Universidade Federal da Bahia, Ícaro Moreira explica que, em uma primeira análise através de observação visual, pesquisadores acreditam que o óleo de agora é o mesmo de dois anos atrás. Os resquícios, que poderiam estar no fundo do mar, em rochas ou em sedimentos de manguezais, teriam reaparecido após a ressaca no mar. A comparação entre os dois óleos será feita em laboratórios.

— As características físicas que observamos se assemelham àquelas de 2019. Além disso, o óleo tem chegado à costa em forma esférica, o que indica que já estava há muito tempo naquele ambiente aquático marinho. E com a turbulência do mar, tende a ficar num formato de bola. Quando o óleo é novo, ele fica na superfície do mar, com bastante brilho. Mas muitos petróleos de origem diferentes podem apresentar característica visual semelhante, então a hipótese precisa ser confirmada por comprovação química.

Luis Ernesto Arruda, professor do Labomar da Universidade Federal do Ceará (UFC) e cientista-chefe de Meio Ambiente do Ceará, corrobora a hipótese. Apesar de reforçar que é preciso confirmar em laboratório a origem do óleo, ele explicou que já é possível afastar a possibilidade de um vazamento recente.

— São pequenas manchas, bolotas. Nessa época do ano, no segundo semestre, o vento vira no Nordeste e sopra o que está no oceano em direção ao continente. Nos últimos anos já apareceram outras coisas nas praias, nesse período do ano, como pacotes de borracha em 2018 e descobrimos que era de um navio alemão naufragado na 2 guerra — disse Arruda. — Apesar de agora estar em volume menor, já é uma quantidade que afeta a biodiversidade.

Depois de meses de mistério, no ano passado a Polícia Federal concluiu que o derramamento de 2019 teria origem em um petroleiro grego, que passou próximo à costa do Nordeste naquela época e que carregava substância semelhante à encontrada. No entanto, Arruda diz que outras pesquisas feitas por sua equipe em conjunto com cientistas americanos apontam também a possibilidade de um óleo oriundo de naufrágio antigo, entre as décadas de 40 e 50.

— A origem ainda não é totalmente certa, mas nós levantamos a hipótese de naufrágio antigo. Já ocorreram casos semelhantes nos EUA — acrescentou.

Nos últimos dias, os governos estaduais começaram a agir na intensificação de monitoramento e limpeza das praias. Em Pernambuco, por exemplo, onde já se constatou a poluição em 13 municípios, foi acionado o “plano de prevenção de resposta rápida a emergências ambientais” e as equipes de monitoramento e de limpeza foram ampliadas. As amostras recolhidas no estado estão sendo analisadas em laboratórios da Universidade Federal do Pernambuco e da Marinha, no Rio.

Na Bahia, o problema já afeta 11 praias e em Salvador foi recolhido um quilo do material. No Ceará, as manchas ainda não foram identificadas, mas a Secretaria estadual de Meio Ambiente oficiou os 20 municípios costeiros a intensificarem a fiscalização. Pesquisadores recomendam que o óleo seja retirado o mais rápido possível das praias, a fim de não causar novos danos. Ícaro Moreira destaca que estudos da UFBA vêm mostrando aumento da concentração de hidrocarbonetos de petróleo, liberados por esse tipo de óleo, nos pescados da costa.

– O acúmulo de hidrocarbonetos tem aumentado nos tecidos dos camarões, ostras e siris, inclusive com níveis que podem comprometer a saúde humana – afirmou Moreira, que cita medidas que deveriam ter sido tomadas a nível federal, a fim de mitigar esses danos. – Uso de barreiras para evitar a chegada da mancha na costa, limpeza imediata após chegada do óleo nas praias ou uso de biotecnologias já patenteadas no país. No entanto, essas iniciativas não foram colocadas em prática, tornando o processo mais complexo do que deveria. Dessa forma, enquanto o óleo estiver próximo à costa, em momentos de ressaca do mar teremos reaparecimentos recorrentes.

Procurado, o Ibama informou que “a equipe de emergência ambiental realizou sobrevoo de análise da costa e do alto mar nesta segunda-feira (29) e não encontrou vestígios de manchas de óleo no litoral nordestino, que seguirá em monitoramento nos próximos dias. Os fragmentos coletados em algumas praias foram encaminhados para análise, a fim de tentar identificar sua origem”.